A poesia
A poesia traz significados que vão além das palavras que a compõe. É, como disse Fernando Pessoa, "uma forma de arte que se dirige à nossa alma profunda". Penso que, primeiramente, deve-se separar a leitura que a mente faz daquela feita pela alma. Quando a mente lê as palavras da poesia procura interpretar o conjunto de forma mais ou menos reta, com certa exatidão, com racionalidade, tentando entender a realidade que ela transmite. Mas a alma, por outro lado, quando a lê, ouve música, sente aromas, usa sentimentos! A leitura de uma poesia através da alma, sensorial que é, extrai dela mais que os significados da razão, mais que as interpretações retas ou exatas. A alma lê com contornos de dança ao som de uma música que ela exala e, como um perfume, inebria. Uma poesia lida com a alma faz tudo isso no reino do silêncio! E na leitura de uma mesma poesia cada um ouve uma música única, própria. Isso transforma a poesia em uma "coisa" especial para quem a lê! Cada um que a lê se perfuma de forma diferente, dança com uma coreografia diferente ao som da música só sua, com uma motivação só sua, resgatando sentimentos só seus!
Quando se escreve uma poesia os sentimentos não são muito diferentes. Disse o mesmo Fernando Pessoa que "a poesia é uma borboleta, que pousando-me na cabeça, me torne tanto mais ridículo quanto maior for sua própria beleza". Claro, existem poesias que são construídas para atender demandas, não exalam perfume, não despertam vontade de dançar. Cumprem sua função sem recursos da alma. Mas a poesia que vem da alma tem motivações por vezes desconhecidas (nascida no silêncio do poeta!) e que só conseguem se reunir na forma dela mesma, sendo, ainda que ridícula, bela. O aroma captado, a dança sugerida, as lembranças resgatadas, convergem-se diretamente nas palavras escritas e a fragrância é incorporada, assim como também o gestual de dança e os sentimentos. E firma-se então um pacto entre quem escreve e a dança sentimentalmente perfumada que outros, quando a lerem, sentirão e dançarão igualmente! É a capacidade de promover esta conexão que eleva os poetas à categoria de mágicos... Ou deuses!
No mistério do sem-fim
equilibra-se um planeta.
E, no planeta, um jardim,
e, no jardim, um canteiro:
e, no canteiro, uma violeta,
e sobre ela, o dia inteiro,
entre o planeta e o Sem-Fim,
a asa de uma borboleta”.
(Cecília Meireles)
Consegues ouvir uma música dançante a partir, talvez, das asas da borboleta? Consegues sentir o aroma de um perfume exalado, talvez, pela violeta? Consegues perceber um sentimento profundo, por certo, vindo do fascínio pelo mistério? Essa é a leitura feita pela alma, pela minha alma. Qual música escutas, qual perfume sentes e qual sentimento te desperta este poema? Diz-me.
Foto: Meu paraíso, Jan/22 (mesmo que a flor não seja violeta, vale a intenção)
Sempre um texto precioso com grande carpintaria poética. Parabéns!
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