O café esfriou


"Cessa a chuva, e dela fica, um momento, uma poalha de diamantes mínimos, como se, no alto, qualquer coisa como uma grande toalha se sacudisse azulmente dessas migalhinhas." (Fernando Pessoa)

Depois de uma chuva noturna, mansa, acordei mais cedo que o normal... Madrugada ainda e o corpo se recusou a ficar na cama, tudo escuro lá fora.

Me coloquei de pé e fui à cozinha. Cafeteira ao fogo, aguardei. Uma porção de café, gotas de leite e outras de adoçante. Xícara na mão, me dirigi para a sacada e, cotovelos no parapeito, fiquei a observar o que mal se via. Paisagem urbana: ruas desertas pouco iluminadas e prédios semi-escondidos na escuridão com raras luzes mostrando que eu não estava só. Ainda se via alguns "diamantes" de chuva na contra-luz dos postes...

Respirei profundamente um ar fresco, umedecido pela chuva da noite que estava se exaurindo, e fiquei observando. Pouco a pouco a magia foi se fazendo presente. A luz da manhã, inicialmente tímida, começou sua descida do alto dos prédios, revelando tudo, até chegar às ruas molhadas, já não tão desertas. Vários sons matinais despertaram para suas rotinas, como os primeiros carros impondo suas presenças; também alguns pedestres caminhavam apressados e raros pássaros se faziam ouvir. Finalmente, amanheceu... Novo dia!

Veio então na memória:

"Devia era, logo de manhã, passar um sonho pelo rosto. É isso que impede o tempo e atrasa a ruga." (Mia Couto)

E muitos pensamentos bons vieram, alguns na forma de sonhos... E fiquei contente, alegre por ter acordado mais cedo.

Levei a xícara a boca e descobri: o café esfriou! Então, ri de mim mesmo.

Foto: Xícara de porcelana polonesa, coleção própria.

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